quinta-feira, 26 de novembro de 2009

Engarrafamento na selva amazônica



Só mesmo aqui na Guiana Francesa, lugar estrategicamente abandonado pela França, podemos ver uma coisa bizarra como essa. Um engarrafamento de mais de quatro horas em pleno nada, no meio do mato. Como tudo por aqui, o governo local, apesar de receber muitos Euros proporcionados pela base espacial em Kourou, não faz o mínimo necessário para manutenção em condições razoáveis do equipamento público geral. O que vemos é uma região que ninguém afirmaria, se não informado previamente, ser a localização do centro espacial europeu. Como não fazem o dever de casa direito, deixaram sem manutenção a única ponte que liga a cidade de Caiena a Kourou. O resultado da irresponsabilidade foi a constatação tardia de que a estrutura da ponte estava preste a ruir, inclusive, um pilar jà havia afundado no rio. Decidiram pelo interrupção do fluxo em uma das faixas e hoje, fechamento da ponte para reparos. O problema é que esta era a única via  relativamente segura de Kourou para Caiena. Uma outra opção para se sair da cidade, onde vemos na foto, é estreita, perigosa e sem nenhuma iluminação a noite. Para piorar ficamos sabendo que uma das pontes de metal nesse acesso também está prestes a cair. Quem precisa, irà se arriscar, não terá saída. Ficamos ilhados em Kourou, provavelmente não haverá entrega de mercadorias na cidade por falta de rota para os caminhões, pela manhã, todos corriam para os mercadinhos a fim de garantir suas sobrevivências até que tudo se normalize. Que coisa... Isso é Guiana, você não vai acreditar (slogan da secretaria de turismo)...

quinta-feira, 12 de novembro de 2009

Muitas razões para dizer não a vacinação contra o virus Influenza A (H1N1)


Não é novidade para ninguém, a total falta de limites, quando se pensa em ganância, com  a qual as grandes indústrias farmacêuticas encaram a possibilidade de lucro. Já trabalhei como colaboradora de um grande laboratório farmacêutico e vi, mesmo vivenciando pouco apenas  do patamar periférico de atuação desse tipo de organização que, visando as metas dos exorbitantes lucros que sempre conseguem, são capazes de qualquer coisa. Aprendi cedo a nunca confiar nas grandes indústrias, principalmente as farmacêuticas. O que me preocupa nisso tudo, é saber que eles conseguem facilmente a compactuação dos governos nesses esquemas, liberam medicamentos com testes forjados  e colocam em risco a saúde de milhares de pessoas em função de seus lucros. Não duvidaria nada, se o ressurgimento de doenças ou aparecimento desses novos microorganismos mutantes, não aconteceram e acontecem por intervenção humana. Nos grupos de pacientes que acompanhava, sempre surgia essa questão, muitos davam risadas e encaravam tudo como história mirabolante ou lendas urbanas típicas, fruto de teorias conspiratórias, mas sei que essa dúvida sempre ficava no ar, principalmente por eles terem se tornado vítimas de uma dessas doenças de surgimento duvidoso. Voltando ao caso da Influenza pelo vírus A (H1N1), decidi não tomar a vacina e orientei todos os familiares e amigos a fazerem o mesmo.  Não sou a única a considerar essa nova vacina uma potencial causadora de doenças graves num futuro próximo ou bem distante (esse talvez, pode ser o pior problema). A seguir estou postando um alerta que a Fiocruz emitiu em agosto.

Pressa na produção da vacina contra Influenza A (H1N1) pode oferecer riscos à saúde

13/08/2009
A emergência no desenvolvimento de uma vacina eficaz contra o vírus da gripe A (H1N1) pode acarretar na supressão de importantes fases de testes que avaliam a segurança do imunizante. Além disso, o procedimento usado no desenvolvimento da vacina contra a atual pandemia de influenza pode trazer riscos de câncer aos indivíduos. O alerta foi feito por Wolfgang Wodarg, respeitado especialista em saúde pública da Alemanha e membro da Comissão de Saúde do Parlamento Europeu. Para o pneumologista, os testes clínicos estão sendo realizados através de métodos rápidos mas pouco testados, num período muito mais curto do que o habitual - um ano.

O processo usual na produção de imunizantes é concebido através da cultura em ovos de galinha. O método é seguro mas lento porque cada ovo fornece uma dose. A preocupação de Wodarg tem como alvo a vacina produzida pelo laboratório Novartis, desenvolvida por cientistas da Universidade de Marburg, na Alemanha, e é baseada no uso de cultura de células cancerosas de animais. Com esta técnica, é possível fazer em uma semana cerca de cinco milhões de doses. O processo de testagem começou há duas semanas, e Wodarg afirma que na correria para disponibilizá-la será apenas possível saber se ela causa alergias. Para investigar o risco de câncer, é preciso tempo.

- As células estão infectadas com o vírus. A técnica é mais rápida porque esse tipo de célula se multiplica muito, e depressa, o que acelera a produção de doses. Mas se houver impureza, essas células poderiam causar câncer. Precisamos descartar esse risco.

O diretor do Instituto de Virologia da Universidade de Marburg e chefe da equipe que desenvolveu a vacina da Novartis, Stephan Becker, defende o método utilizado e admite os riscos, mas afirma ser "a única forma de obter milhões de vacinas numa pandemia". Além da Novartis, outros laboratórios também estão se mobilizando no desenvolvimento de uma vacina, como a GlaxoSmithKline, Sanofi-Pasteur e CSL. No Brasil, a Fundação Instituto Butantan recebeu a cepa do vírus H1N1 para a produção de uma vacina. Segundo o presidente da instituição, Isaías Raw, a cepa foi enviada pela Organização Mundial da Saúde (OMS) e serão fabricadas, inicialmente, 30 milhões de doses. A inteção é distribuir a vacina em janeiro de 2010. O Ministério da Saúde também negocia com o Sanofi-Pasteur a importação de 17 milhões de doses.

Especialistas enxergam a corrida na produção de vacinas como uma forma de alimentar interesses dos grandes laboratórios. No ano de 1976, a tentativa de imunização às pressas nos Estados Unidos contra uma possível pandemia de influenza H1N1 causou mais transtornos do que benefícios. Milhares de pessoas desenvolveram reação vacinal e houve vários relatos de síndrome de Guillain-Barré, doença rara que afeta os nervos.

Enquanto as dicussões a respeito da segurança das vacinas contra o H1N1 acontecem, a gripe suína vem gerando lucros exorbitantes às receitas do laboratório Roche, responsável pela comercialização do Tamiflu. Desde o surgimento da doença em abril, a compra do medicamento triplicou, alcançando cerca de US$ 930 milhões em vendas em farmácias e estoques feitos por governos no mundo inteiro. Uma projeção divulgada pela Roche estima que o Tamiflu alcance quase US$ 2 bilhões de dólares em vendas até o fim do ano.


segunda-feira, 9 de novembro de 2009

Ganho bem = Vivo bem?

Definitivamente essa equação não é válida, quando tratamos de Guiana Francesa. Muitos aterrissam nesse território com a esperança de ganhar um alto salário, o que inconscientemente, implicaria numa melhor qualidade de vida, contudo, a triste realidade local se apresenta logo cedo para o visitante recém chegado. Apesar do alto custo de vida, superior ao da França real, não há em contrapartida, um oferecimento condizente de serviços ou produtos, o que acaba tornando surreal os gastos cotidianos com coisas de baixíssima qualidade. Uma simples ida a um mercado local se traduz num pesadelo diário para os moradores de Kourou. Desabastecimento ou abastecimento irregular, limpeza precária e armazenamento em condições duvidosas, preços impraticáveis e pouquíssima variedade de produtos. Muita gente tem o privilégio de ganhar muito bem por aqui mas, por outro lado, não podem sequer ter uma alimentação saudável ou minimamente balanceada. Sem contar com a falta de estrutura cultural e até governamental, ruas esburacadas e sujas, paisagem geral feia e defasada e inexistência de equipamentos culturais e de lazer. Por um lado a população local tem grande parcela de culpa, pela falta de civismo e educação, jogam todo tipo de lixo nas ruas e praias deixando as poucas áreas de lazer coletivo imundas e perigosas, pela quantidade de garrafas quebradas e vidros espalhados, e por não se sentirem parte do local, não se responsabilizam por nada e também não cobram serviços melhores, por parte do governo local e dos comerciantes que só lucram e pouco se importam com seus consumidores. O produto final disso tudo é a constatação de que o dinheiro não vale muito para quem quer ter uma vida com qualidade, pelo menos por aqui...

domingo, 8 de novembro de 2009

Identidade Cultural Guianesa



 Desde que cheguei, tento desvendar um pouco os mistérios sociais e culturais desse estranho território. Percebi que, além das grandes questões sociais, maquiadas superficialmente pelas autoridades francesas e locais, a Guiana sofre com uma profunda falta de identidade cultural. É certo que, com a variedade cultural local e a entrada e saída de imigrantes estrangeiros e migrantes franceses, dificilmente se conseguiria, em pouco tempo, uma integração cultural de tantos povos diferentes. Diferente do Brasil que vemos a integração cultural dos povos introduzidos e uma quase fusão, com a produção de uma cultura própria, na Guiana os grupos se isolam e não participam suas características culturais para os demais. Sinto que esses grupos, chegando no novo território, forçadamente buscando integração local, tentam se despirem de suas bagagens culturais e acabam adotando características importadas pelos grupos que aqui se fizeram mais influentes socialmente. O mais curioso é que esses caracteres culturais não são franceses, como se poderia esperar, a grande maioria quando se expressa socialmente, remete a cultura norte americana, tanto na forma de agir socialmente, quanto nas escolhas culturais (música, filmes, etc). Talvez, num futuro ainda distante, esses grupos possam se integrar e usar seus caracteres sociais natos com a finalidade de se criar uma identidade cultural verdadeiramente local. Por enquanto, vemos que a colcha de retalho continuará sendo fabricada, sem que, infelizmente, suas partes se combinem.

terça-feira, 3 de novembro de 2009

Pluralidade Cultural x Identidade Nacional

Sempre acreditei que o mundo só tem sua beleza e, ainda vale alguma coisa, por causa da mágica encantadora que é a diversidade. Já imaginaram se fossemos todos iguais, gostássemos das mesmas coisas, tivéssemos as mesmas opiniões e pior, fabricássemos as mesmas manifestações artísticas e ouvíssemos as mesmas músicas? O mundo seria muito chato e eu, com certeza, pediria para sair dele. A maior riqueza da humanidade é, sem dúvida, esse conjunto maravilhoso formado por humanos e natureza. E, ser humano é ser único, logo diferente, mas que compartilha peculiaridades culturais de todas as partes do planeta, se tornando assim, um ser social e possibilitando as relações humanas com todo e qualquer tipo de cultura. Carregamos em nosso material genético essa história ancestral de misturas e mudanças que possibilitaram a formação dos diferentes tipos humanos de hoje. Não existe povo puro no planeta, todos temos inter-relações ancestrais que criaram a única raça de seres pensantes sobre a terra, que é a raça humana. Por que então enxergar a diferença como uma coisa do mal, se temos tanto em comum e, o pouco que nos é diferente faz do mundo essa explosão de cores e novidades. Não é errado querer e se sentir pertencente a um grupo ou nação. O que não se pode fazer, é negar sua ancestralidade e não enxergar verdadeiramente como seu povo se formou e como ele é. O povo europeu, por exemplo, foi formado por migrações, imigrações, fugas, guerras e conquistas milenares. Em sua ancestralidade tem um pouco de tudo também, turcos, celtas, persas, romanos, gregos, eslavos, asiáticos, dentre muitos outros. Felizmente, a história não mente e, basta estudar um pouquinho os povos antigos para entender que todos temos ancestrais em comum. Falo tudo isso por que tenho visto o aumento do pensamento xenofóbico na Europa e, recentemente o ministro francês da imigração Eric Besson, deu o pontapé inicial para que os franceses elaborem e discutam um modelo de identidade nacional. Sabemos que esse ministro, como muitos outros homens do poder, nutre em seu íntimo um sentimento de intolerância contra os imigrantes e os diferentes, não se dando trabalho nenhum para tentar escondê-lo. Incentivar o nacionalismo, fazendo com que o povo se veja do jeito que quem o comanda deseja, como já vimos na história recente, pode ser muito perigoso. O que vejo de mais belo em algumas cidades francesas, como Paris e Marseille, é essa diversidade cultural nas ruas. Pessoas de todo tipo, de cores, trajes, religiões, línguas, que convivem harmonicamente e congregam de um bem comum que é a própria França. É burrice negar a existência dessa nação diferente dentro de outra nação, e aproveitar, como sei que muitos fazem, dessa avalanche cultural de todas as partes do mundo. E, não sei se deram conta de uma face da França que convive com uma diversidade étnica e cultural maior ainda, e muito mais problemática, que é a França escondida nos territórios ultra marinhos (Guiana Francesa, Martinica, Guadalupe e Reunião). Por que, para o povo que vive nesses territórios, o sentimento e o que lhe é falado, é que ele é também parte do povo francês, contudo, bem sei que esse discurso é apenas para que ele continue lá, escondido, pacífico, correspondendo aos interesses dos governantes e, o mais importante, se mantendo bem distante da verdadeira França. Por que acham que aquilo lá não se parece com a França que eles idealizam, não pode então tomar parte na identidade do povo francês. "Ora, nem ao menos se parecem com europeus", devem dizer...Vou mais além para afirmar que os países europeus, bem como o EUA, tem uma dívida imensurável com os povos latinos, orientais e africanos pois, enriqueceram através da colonização de lugares que já tinham seus donos, saquearam e dizimaram culturas, escravizaram, intermediaram e favoreceram governos de ditadores, financiaram e contrabandiaram armas colocando povos e etnias umas contra as outras para lucrarem com suas guerras. Então, mais do que justo que esses imigrantes sejam sim recebidos, e esses governos paguem um mínimo de suas dívidas.
Escrevi esse texto hoje pela manhã, na verdade estava muito melhor, acabei perdendo antes de salvá-lo. Só agora à noite li a triste notícia que Lévi-Strauss faleceu, ele que nos deixou um precioso legado , e para nós no Brasil, acho que maior ainda, pois fez toda diferença no desenvolvimento do pensamento brasileiro...

"Na era da mundialização, em que a diversidade externa tende a tornar-se cada vez mais pobre, torna-se urgente manter e preservar a diversidade interna de cada sociedade, gestada por todos os grupos e subgrupos humanos que a constituem e que desenvolvem, cada um, diferenças às quais atribuem extrema importância. Em certa medida, a diversidade cultural poderá pelo menos ser mantida e estimulada pela preservação das especificidades culturais dos diferentes grupos sociais: assim como se criam bancos de genes de espécies vegetais para evitar o empobrecimento da diversidade biológica e o enfraquecimento de nosso ambiente terrestre, é preciso, para que a vitalidade das sociedades não seja ameaçada, conservar, ao menos, a memória viva de costumes, de práticas e saberes insubstituíveis que não devem desaparecer. Pois é a diversidade que deve ser salva, não o conteúdo histórico que cada época lhe conferiu e que ninguém saberá perpetuar para além dela própria. A nova legislação brasileira abre, nesse sentido, vias que poderão ser úteis como inspiração para toda a comunidade internacional." (LEVI-STRAUSS, 2001:27).

..."creio que a humanidade permanecerá diversa, essa é sua única chance". (Lévi-Strauss)