terça-feira, 3 de novembro de 2009

Pluralidade Cultural x Identidade Nacional

Sempre acreditei que o mundo só tem sua beleza e, ainda vale alguma coisa, por causa da mágica encantadora que é a diversidade. Já imaginaram se fossemos todos iguais, gostássemos das mesmas coisas, tivéssemos as mesmas opiniões e pior, fabricássemos as mesmas manifestações artísticas e ouvíssemos as mesmas músicas? O mundo seria muito chato e eu, com certeza, pediria para sair dele. A maior riqueza da humanidade é, sem dúvida, esse conjunto maravilhoso formado por humanos e natureza. E, ser humano é ser único, logo diferente, mas que compartilha peculiaridades culturais de todas as partes do planeta, se tornando assim, um ser social e possibilitando as relações humanas com todo e qualquer tipo de cultura. Carregamos em nosso material genético essa história ancestral de misturas e mudanças que possibilitaram a formação dos diferentes tipos humanos de hoje. Não existe povo puro no planeta, todos temos inter-relações ancestrais que criaram a única raça de seres pensantes sobre a terra, que é a raça humana. Por que então enxergar a diferença como uma coisa do mal, se temos tanto em comum e, o pouco que nos é diferente faz do mundo essa explosão de cores e novidades. Não é errado querer e se sentir pertencente a um grupo ou nação. O que não se pode fazer, é negar sua ancestralidade e não enxergar verdadeiramente como seu povo se formou e como ele é. O povo europeu, por exemplo, foi formado por migrações, imigrações, fugas, guerras e conquistas milenares. Em sua ancestralidade tem um pouco de tudo também, turcos, celtas, persas, romanos, gregos, eslavos, asiáticos, dentre muitos outros. Felizmente, a história não mente e, basta estudar um pouquinho os povos antigos para entender que todos temos ancestrais em comum. Falo tudo isso por que tenho visto o aumento do pensamento xenofóbico na Europa e, recentemente o ministro francês da imigração Eric Besson, deu o pontapé inicial para que os franceses elaborem e discutam um modelo de identidade nacional. Sabemos que esse ministro, como muitos outros homens do poder, nutre em seu íntimo um sentimento de intolerância contra os imigrantes e os diferentes, não se dando trabalho nenhum para tentar escondê-lo. Incentivar o nacionalismo, fazendo com que o povo se veja do jeito que quem o comanda deseja, como já vimos na história recente, pode ser muito perigoso. O que vejo de mais belo em algumas cidades francesas, como Paris e Marseille, é essa diversidade cultural nas ruas. Pessoas de todo tipo, de cores, trajes, religiões, línguas, que convivem harmonicamente e congregam de um bem comum que é a própria França. É burrice negar a existência dessa nação diferente dentro de outra nação, e aproveitar, como sei que muitos fazem, dessa avalanche cultural de todas as partes do mundo. E, não sei se deram conta de uma face da França que convive com uma diversidade étnica e cultural maior ainda, e muito mais problemática, que é a França escondida nos territórios ultra marinhos (Guiana Francesa, Martinica, Guadalupe e Reunião). Por que, para o povo que vive nesses territórios, o sentimento e o que lhe é falado, é que ele é também parte do povo francês, contudo, bem sei que esse discurso é apenas para que ele continue lá, escondido, pacífico, correspondendo aos interesses dos governantes e, o mais importante, se mantendo bem distante da verdadeira França. Por que acham que aquilo lá não se parece com a França que eles idealizam, não pode então tomar parte na identidade do povo francês. "Ora, nem ao menos se parecem com europeus", devem dizer...Vou mais além para afirmar que os países europeus, bem como o EUA, tem uma dívida imensurável com os povos latinos, orientais e africanos pois, enriqueceram através da colonização de lugares que já tinham seus donos, saquearam e dizimaram culturas, escravizaram, intermediaram e favoreceram governos de ditadores, financiaram e contrabandiaram armas colocando povos e etnias umas contra as outras para lucrarem com suas guerras. Então, mais do que justo que esses imigrantes sejam sim recebidos, e esses governos paguem um mínimo de suas dívidas.
Escrevi esse texto hoje pela manhã, na verdade estava muito melhor, acabei perdendo antes de salvá-lo. Só agora à noite li a triste notícia que Lévi-Strauss faleceu, ele que nos deixou um precioso legado , e para nós no Brasil, acho que maior ainda, pois fez toda diferença no desenvolvimento do pensamento brasileiro...

"Na era da mundialização, em que a diversidade externa tende a tornar-se cada vez mais pobre, torna-se urgente manter e preservar a diversidade interna de cada sociedade, gestada por todos os grupos e subgrupos humanos que a constituem e que desenvolvem, cada um, diferenças às quais atribuem extrema importância. Em certa medida, a diversidade cultural poderá pelo menos ser mantida e estimulada pela preservação das especificidades culturais dos diferentes grupos sociais: assim como se criam bancos de genes de espécies vegetais para evitar o empobrecimento da diversidade biológica e o enfraquecimento de nosso ambiente terrestre, é preciso, para que a vitalidade das sociedades não seja ameaçada, conservar, ao menos, a memória viva de costumes, de práticas e saberes insubstituíveis que não devem desaparecer. Pois é a diversidade que deve ser salva, não o conteúdo histórico que cada época lhe conferiu e que ninguém saberá perpetuar para além dela própria. A nova legislação brasileira abre, nesse sentido, vias que poderão ser úteis como inspiração para toda a comunidade internacional." (LEVI-STRAUSS, 2001:27).

..."creio que a humanidade permanecerá diversa, essa é sua única chance". (Lévi-Strauss)


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